quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Fadas de Férias




Que maravilha, Alice!
Dares um rabo de Sereia
ao Lobo, só porque
o Espelho disse que a tua
Trança não era a mais Bela...
Pisar a cara da Bruxa
com teus Sapatos de Cristal
e depois, era uma vez,
muito relaxada, comer
as Maçãs Caramelizadas
enquanto a tua namorada
sonha, Adormecida, no
Coração da Floresta.

PAR - PT
13.12.12

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Face Escura




A noite não estava fria
no entanto tudo tremia
em teu corpo onde já
nenhum medo existia
não havia dores ou erros
só as nuvens e as pontas
dos teus dedos em baixo
das minhas pálpebras
teus dedos a tamborilar
desgraças em meu coração
a fazer-me cócegas
a puxar-me os cabelos
a noite gritava nas cavidades
nas dobras da cortina do chuveiro
a noite não estava adormecida
na epiderme da lua sólida
a noite apenas doía seca
nos dentes sensíveis
a noite brincava distraída
com as tuas gengivas
como se fossem bonecos vodu
a noite deseja a tua língua
em todos os orifícios
da superfície da lua húmida.

PAR - PT

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Cerimônia




Há filmes que não acabam
e chuvas...
há medos que não recuam
e sombras...
há coisas que devia dizer-te
mas não
não há mais nada que possa
dizer
há silêncios por tirar
dos cantos...
acumulados nos rodapés...
há pegadas na areia
não há habitantes no
fundo do mar, no solo
lunar, mas há as naves...
há sinais fechados, sinais
de fumo e muitos gritos
nas salas deste
manicômio em festa
há bandeiras por hastear
e beijos nos orgãos pendentes
uma corrente eléctrica
que enche de sangue
os corpos cavernosos...
depois disso, tudo é gelo
nos polos
há malas esquecidas nas
esteiras dos aeroportos
e no fundo, areias,
carcaças de sereias e
cachalotes...
os olhos aflitos a
perscrutar florestas
petrificadas e fósseis
dos nossos sentimentos
que nós pensávamos
tão modernos, tão
eternos e liberais,
mas não são, as emoções
são arcaicas, as
emoções não são ergonômicas
e incomodam sobremaneira
os músculos da região
lombar...
as emoções são verbos
inconjugáveis, amar,
desejar, perder, as
emoções agrupam-se
para esquecer o inverno...
e nós só queremos
reencontrar os seres
que amámos e arrastar
suas correntes no inferno
sob a chuva, incessante,
de enxofre e a sombra
omnipotente da paixão
e há filmes que nunca
mais acabam.

PAR - PT
10.12.12

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Mulheres




Extraterrestres
impossíveis de compreender
por maior que seja o esforço
por mais simples que sejam
as coisas
elas hão de encontrar sempre
detalhes inexplicáveis
mistérios insondáveis
vão sempre alterar a realidade
com suas lentes côncavas
ou com as convexas
mas
ouvir e simplesmente calar-se
será para sempre
uma impossibilidade
as coisas têm de ser como
elas imaginam que querem
como elas pensam que sabem
como elas gostariam que fossem
não são capazes de perceber
que o mundo não gira
à volta de suas vaginas
e que nem sempre a verdade
foi parida por uma delas
e que são absolutamente
complexas
simplesmente complexas.

PAR - PT
06.12.12

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Bilateral




Nasci bípede,
tornei-me bilíngue,
descobri-me bissexual.
Sou bipolar,
sou bicudo,
joguei bingo.

chamaram-me bicho
chamaram-me bicha
mas, bígamo, nunca fui!

Odeio bitolados
e já usei bigode...
sou teimoso como uma bigorna.

Estudei biologia e
sofro de bibliofilia.
Perdi a fé depois de ler a Bíblia
e não sei andar de bicicleta.

Já amei dois bichanos,
comi bifes, não como mais.
Tive o prazer de conviver
com uma bisavó.

Certas bizarrias atraem-me
e amo Arte Bizantina.
Odeio Bispos.
Adoro biscoitos.
Sempre tive a mania
de virar os binóculos
ao contrário e há uns
largos anos
sofri intervenção cirúrgica
para retirada
da vesícula biliar,
na memória muitas dores
e o brilho do frio do bisturi.

Namorei bicornes e
línguas bífidas.

Desejo resolver a equação
biquadrada do código
binário da minha
herança genética
biodegradável.

PAR - PT
25.10.12

Semântica e Pedras na Vesícula, qual delas extirpar primeiro?




Conforme o tempo passa
a paisagem à nossa volta
faz-se mais ampla
a paisagem canta canções
de embalar
a paisagem entrega-nos
ao sonho
cada pedra minúscula
que habita a paisagem
recita Hamlet de cor
cada pedra é
cada pedra não é
posta em questão...
as pedras escondem-se
sob o musgo
pode-se sentir os continentes
à deriva
sob as solas dos pés
pode-se ouvir o tempo
encravar-se nas roldanas
dos mecanismos
esquecidos em baixo da cama.

PAR - PT

domingo, 2 de dezembro de 2012

Nem um Tom de Cinza



Deixaram-me cristais de sal
nos espaços dos dentes
madrugadas perdidas
contracções vaginais
lábia lobos limbo
e um trem que passa
lambe os trilhos
leva pessoas que nunca vi
deixa memórias na plataforma
cristais de açúcar
nos cantos dos olhos
e pedras nos rins
uma melancolia suicida
apodera-se da pele
e faz estalar
perfura as paredes
tão brancas
tão brancas
tão brancas
perfura as paredes
e pendura quadros
fotografias cadáveres
um sabor
maníaco-depressivo
dá cor às paredes
tão brancas
tão brancas
algo que não está lá
ocupa agora
o perímetro total
do branco da parede
 e há lâminas nas ranhuras
dos tacos no chão
há lâminas nos cílios
e os olhos ardem
os olhos são tão brancos
e riscados de vermelho
os olhos
o branco dos olhos
no branco das paredes
e a neve que cai
nunca é branca
a neve tem a cor
que a neve tem
quando não é branca...

PAR - PT

Santa Poesia